Naquela manhã de domingo, o sol quente ali na porta da cozinha
aquecia os pés frios pela brisa gelada de um inverno rigoroso.
Eles estavam ali, se aquecendo no sol enquanto a água fervia
para um café forte. Lá fora, o ladrilho brilhava pelo sereno da noite, as
folhas das plantas dos vasos mexiam devagarzinho. O momento era melancólico,
mas era confortável.
Os olhos nunca se encontravam, mas as palavras eram
incansáveis. Lentas, espaçadas e com um volume muito baixo, mas presentes em
cada segundo.
Enquanto ele contava uma história de sua infância, ela ouvia
e comentava, da forma mais interessada possível. Sorrisos iam e vinham, na
maior naturalidade e preguiça matinal possível.
Os cabelos dela formavam leves cachos, bagunçados e caídos
pelas costas e pelo rosto, que ele arrumava para trás de sua orelha sempre que
queria olhar em seus olhos, oferecer um sorriso ou dar um beijo leve,
carinhoso.
Ele passou o café e a ofereceu, que se mantinha ali,
apoiando o corpo no batente da porta, se abrigando no sol e olhando para o lado
de fora, para nenhum ponto específico. Apenas observava.
Os assuntos iam variando, mudando, se tornando mais importantes,
menos interessantes, mais engraçados, menos extensos. Ele se sentou ali, na sua
frente e ofereceu sua mão, que ela aceitou e segurou, como um elo que precisava
ser estabelecido naquele instante.
Ali não tinham vizinhos, não tinham cachorros, barulho quase
nenhum. Era cedo, é verdade, mas o tempo não mudaria essa realidade.
Eles falavam sem parar, mas a cena parecia de silêncio,
quase de vazio.
Ali, estava estabelecida a normalidade, a rotina, o simples,
o básico, o esperado. Impressionantemente aquilo era bem vindo, era confortante,
era bem recebido.
Depois do café, um pequeno abraço, que ficou apertado, que
ficou mais longo.
Depois do abraço, um olhar, um pequeno sorriso, um pequeno
beijo, que ficou intenso, que ficou longo.
Ali, naquele intervalo de 23 minutos o simples foi vivido,
sem qualquer pretensão de tornar-se especial, único, incrível.
O sol marcou o momento, a rotina não.
Depois daquele instante, outro foi vivido, mais simples,
mais rotineiro, mais sem sal. Mas cheio de açúcar.
Não precisava ser extraordinário, precisava ser confortante,
certo. Um cenário nada imaginário, algo real, palpável, convencional.
A simplicidade de pés apenas com meias, roupas largas e
desajeitadas, cabelos soltos amanhecidos, bocejos grandes, preguiças
incontroláveis, o coador de café feito de papel.
Assim, simples assim.
2 comentários:
Fofura define.
Muito bom Marianna... tão bem escrito que é impossível não "ver" a cena detalhadamente...
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