Eu não sei o que tô sentindo.
Mas se não sabe, como está
sentindo?
Não sei. Mas de repente eu sei
o que tô pensando.
Eu sei o que eu tô pensando.
Então me conta.
Não sei contar. Sou péssima
com palavras explicativas, termos ilustrativos...
Ah, mas aí eu também não sou
bom com sentimentos.
Até porque sentimento não se
define.
É verdade.
Já percebeu que qualquer
definição de qualquer sentimento é vaga?
Vaga e confusa. Eu acho.
Piegas. Clichê.
Porque quem define sentimento
é porque não sente.
É, passam um tempão tentando
definir, não sobra tempo para sentir.
É como um julgamento. Aí você
só olha para fora, para concluir, esquece de olhar para dentro.
Eu prefiro não sentir. Acho
que vou começar a definir mais.
Mas você tem potencial para
sentir. Nunca pensou nisso?
Não. Mas também meu lado chato
me comanda, fica querendo definir.
Mas eu nunca ouvi você definir
nada. Quer dizer, nunca ouvi você definir sentimentos.
Mas eu posso escrever.
Também nunca li.
Mas eu posso só pensar.
Mas aí é injusto demais. E
pensar só se faz quando não se está fazendo mais nada.
É verdade. Não é bem isso que
faço.
Então por que você diz que
define se nunca vi você definir.
É porque quando estou com você
eu sinto. E quem sente não define.
Acho que não dá para definir
quem sente também.
É. Isso também não.
Acho que essa mania de
dicionário é bem cansativa.
Eu acho também. Mas não é o
que a gente está fazendo?
Não. A gente está divagando.
Filosofando, talvez?
É filosofia de bar, talvez.
Mas tudo bem.
Eu acho bem interessante.
É. E isso é intrigante.
O quê?
Isso.
Isso o quê?
A gente.
Como assim?
Como a gente lida com as
coisas.
Que coisas?
Qualquer coisa. O que a gente
vê, pensa, sente...
Eu gosto do jeito que você
lida comigo.
Por quê?
Porque você não me define,
você me pergunta as definições.
É, mas eu não acredito em
várias delas.
Mas deveria, sou bem honesta.
Especialmente sobre mim.
Não, eu olho para você e leio
tudo, o que você diz sobre você carrega julgamento.
Mas a gente precisa se julgar
de vez em quando.
Eu te julgo. Te julgo mais do
que você imagina.
E por que eu não ligo?
Porque você sabe que eu te
acho incrível. Simples.
Mas nada é simples.
Muita coisa é. Mas você não é.
E é disso que mais gosto.
Dá para parar de falar que
gosta de mim? Você vai se tornar dependente.
Sou dependente de felicidade.
Se você passa isso para mim, eu vou ficar o resto da vida aqui falando com você.
Ah, uma ótima maneira de disfarçar
sua dependência de mim.
Eu só disfarço isso, não
escondo.
E a gente um dia termina esse
devaneio?
Só quando você parar de
definir coisas.
Paro quando você parar de
pensar.
Então posso pelo menos sentir?
Só se for para sentir algo por
mim.
Mas eu não sou assim tão
sentimental.
Se você for do jeito que eu tô
vendo, já está ótimo, nem precisa ser sentimental.
E você, será que pode ser
menos?
Menos o quê?
Menos o que eu adoro.
O que você adora?
Adoro que você gosta tanto do
que eu também gosto muito.
E o que é isso?
Falar, falar e falar. Será que
a gente um dia para?
Só quando pararmos de pensar.
Ou de sentir.
Parei de sentir.
E eu de pensar.
E o que vamos fazer agora, então?
Boa pergunta...
Um comentário:
GENTE!
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