sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Um bem qualquer



Ele não tinha 50 anos, não tinha cabelos brancos, tampouco uma poupança gorda no banco.

Ele não tinha carteira assinada, não tinha plano de saúde, nem sequer carteira de vacinação em dia.

Ele passava seus dias entre banhos longos, projetos inacabados, ideias brilhantes, copos e mais copos de água com gás e álcool no final do dia. Se o dia fosse muito bom ou muito ruim, fumava dois cigarros. Se fosse mais ou menos, apenas um.

Ele era magro e relativamente alto, mas era do tamanho certo de um abraço. De um afago. De um carinho.

Tinha o coração maior que o mundo e mãos pequenas, mas que eram suficientes para te segurar em qualquer momento de loucura, desespero, tristeza ou euforia.

Ele não sabia seu futuro, muito menos teve qualquer responsabilidade quanto ao planejamento de seu passado. Ele vivia seu presente na mais perfeita confusão. E vivia bem assim.

Ele não sabia bem o que queria, mas sabia que ali, do jeito que estava, estava bom. Na verdade, de vez em quando ele reclamava, resmungava, batia a porta do banheiro um pouco mais forte do que de costume. Mas ele seguia vivendo, feliz do jeito que dava. Era pouco exigente, talvez.

Ele tinha tanto amor guardado, que ninguém sabia lidar. Nem ele, negava, fingia que não via. Uma vez, alguém tentou usar, aproveitar tanto sentimento guardado, mas nem ela soube arrancar e nem ele soube oferecer. Foi uma certa confusão. Mas ninguém saiu, assim, tão machucado. Só um pouquinho.

Ele era especial na maior simplicidade possível. Podia passar despercebido pelo mundo, não fosse tanto carinho que carregava no olhar. Pior, não fazia qualquer esforço para mostrar, mas não sabia esconder.

Ele vivia ali, no canto dele, sem nem mesmo imaginar que alguém queria fazer parte daquilo, mesmo que estranho fosse.

Ele era do bem, ele era o bem de alguém.